Ernesto Trouw
Biography
Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2002) e Pós-Graduado pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET (2004) e pela Universidad de Salamanca – Espanha (2005), ambos em Direito Tributário. Doutorando pela Universidade Autônoma de Lisboa. Diretor do Grupo de Debates Tributários do Rio de Janeiro – GDT-Rio. Diretor da Associação Brasileira de Direito Financeiro – ABDF
CONFIRA A ENTREVISTA COM O DR. ERNESTO TROUW
1. Em sua opinião é possível falar em um conceito constitucional de bem e de serviços? Tais conceitos representam obstáculo à tributação na economia digital?
Um conceito constitucional, ainda que existisse,provavelmente estaria obsoleto em face da grande mudança que vivemos atualmente no nosso mundo.
É bom que esses conceitos não existam na Constituição, pois a Constituição não deve ter um conceito fechado sobre esse assunto.
Creio que cada vez mais esses conceitos deveriam ser determinados por normas, ou até eventualmente por outros organismos que não sejam legislativos e, que também tenham uma capacidade de atualização tão rápida, ou mais rápida que a atual, ou simplesmente tão rápida quanto à mudança que o nosso mundo vivencia.
Quando se tem um conceito fechado, esse conceito acaba se tornando obsoleto muito rápido. Alterar a Constituição para definir o que é serviço, bens e mercadorias é uma dificuldade muito grande.
2. De que forma as propostas de reforma tributaria em debate no Congresso Nacional impactam a tributação da economia digital?
Impactam de uma maneira muito relevante.
Uma mudança na forma que tributamos hoje e uma reestruturação da tributação do consumo, com certeza, devem envolver a economia digital.
Algumas propostas que existem hoje são mais abrangentes e preveem um pouco mais essa questão da tributação da economia digital.Já outras são extremamente supérfluas e focam muito mais nos problemas atuais e não veem tanto a necessidade de ter uma atualização na legislação quanto à isso. Entretanto, com certeza, a reforma tributária que virá deve atender a dificuldade que há atualmente de tributar as atividades digitais.
É essencial que essa discussão hoje seja uma das mais importante,se não a mais importante, porque essa reforma vem para pensar no futuro ea economia digital será cada vez mais relevante, de modo que a tributação precisará focar em como ser atingida de maneira justa e melhor dividida entre os entes.
Olhar para uma reforma sem pensar claramente que isso não é mais futuro e sim presente, é tentar consertar um problema deixando um problema maior ainda.
3. O federalismo brasileiro com a divisão de competências tributárias entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios representa um fator de complexidade adicional na tributação de Economia Digital?
Com certeza. Quando olhamos as discussões que existem hoje em outros lugares do mundo, vemos que eles já superaram muitas das brigas que existem aqui, como: da divisão entre Estados e Municípios nessa tributação de serviços e mercadorias, nessa definição. Esses lugares seguem uma linhade que é indiferente se é serviço ou mercadoria ejá conseguem passar para outra fase em relação à discussão.
Hoje o Brasil tem diversos institutos de tributação, que facilitariam a tributação da economia digital. Há um ano estive na Coreia do Sul e uma das discussões que enfrentamos, inclusive de um painel que fui o relator do Brasil, era sobre a questão das retenções de tributos e que o mundo tinha parado de adotar tal prática, sendo que é algo que utilizamos muito no Brasil e, com a economia digital isso passou a ser analisado e talvez até mesmo voltará a ser utilizado por eles.
Possuímos institutos que são muito eficazes para tributar a economia digital. O Brasil tem algumas questões em relação ao federalismo que atrapalham, mas por outro lado tem outras questões no nosso sistema tributário que facilitam. Seria muito bom pensar em excluir essa questão de diferença de ISS e ICMS e conseguir solucionar essas discussões, mas também é importante ressaltar que, em outros pontos estamos evoluídos e temos mecanismos eficazes para essa tributação.
4. Como a legislação tributária pode acompanhar o dinamismo e a rapidez das inovações tecnológicas a fim de tributar de forma adequada a economia digital?
A legislação precisa passar a entender o problema e isso é algo que os legisladores não entendem tanto. É preciso começar a pensar de maneira diferente para encontrar a solução mais adequada. As soluções que haviam no passado não servem para os problemasatuais. Precisamos de novas soluções.
Nesse caminho deve-se passar a entender que não são conceitos rígidos que vão conseguir atingir uma economia extremamente fluida. A norma rígida não funciona para a economia digital. A economia digital não é rígida, é fluida e sempre tem uma coisa nova. Há uma mobilidade muito grande das empresas em relação a isso, pois uma empresa que está em um país consegue em questão de dias se mudar para outro país.
É difícil conseguir determinar os princípios, dados, os tributos e etc., porque isso é muito fluido e inclusive já tem atividades que são totalmente não tributadas, logo, não geram uma renda, mas tem um fisco de valor muito grande e movimenta a economia.
A solução seria pensar em institutos que fossem mais maleáveis. Talvez quem deva definir se algo é serviço ou mercadoria não seja mais uma lei, que para ser alterada precisa de uma maioria do congresso e da votação de todos os deputados do país sobre isso. As ABNT’s são um órgão especifico que podem identificar se um novo aplicativo que surgiu está dentro do conceito de questão de uso, de serviço prestado ou de mercadoria, e isso acaba ajudando um pouco o mercado. Os próprios contribuintes não são fãs de um cenário não regulado.É preciso saber também quais são as regras do jogo, então, até uma regulação determinando esses conceitos para os próprios contribuintes é algo bom.
Quando um empresário começa um novo negócio ele tenta calcular quais áreas se encaixam naquele negócio. Se ele tem duvida se é serviço ou um bem e se ele vai tributar pelo ICMS ou pelo ISS, isso gera uma insegurança para o negócio dele. No passo que, se tem uma carga tributaria menor, em longo prazo também se tem risco e ele pode pensar em ter um lucro um pouco maior. Mas, de repente, se esse empresário pensar por um momento em captar recursos ou fazer uma venda do negócio, nesse momento o que vai contar é que há uma insegurança e isso não é bom para ninguém.
Por fim, o caminho básico é passar a olhar um pouco o problema com olhos diferentes do que como se olhava no passado, é um pouco clichê, mas pensar fora da caixa é importante para esse caso.